
Um mago vivia numa imensa aldeia
e todos afirmavam que
ele era capaz de realizar os mais estranhos desejos.
Um dia, quando ele orientava algumas crianças,
um cão aproximou-se e o interrompeu:
" Mago, eu quero que você me transforme num gato".
- Mas por que esse desejo tão tolo, meu amigo?
Respondeu-lhe o cão:
" Eu quero ser admirado por meu andar gracioso,
por ter um pulo certeiro,
por sacar a hora certa de me retirar,
por ser carinhoso sem ser servil,
por saber fazer valer minha vontade,
por não incomodar visitas com festinhas exageradas,
por respeitar e manter intacta minha excêntrica personalidade, por conseguir o que quero
sem lamber a mão de ninguém".
- Muito bem, então. Seja feita sua vontade!
- disse o mago,
tocando o cão com a ponta de um pequeno bastão.
Imediatamente, o cão transformou-se num gato.
Feliz, saiu andando, sentindo-se realmente um gato.
Passados alguns dias, voltou ao mago e
- desta vez muito triste - disse:
" Por favor, Mago, faça-me voltar à minha forma antiga!"
- Você parecia tão certo do que queria!
Por que desistiu, meu amigo?
Respondeu o cão, com ares de muita frustração:
- Minha aparência foi mudada,
virei gato, mas não consegui caminhar tão
graciosamente como um deles e derrubava
tudo por onde passava;
quando achei que meu pulo seria certeiro,
vários ratos e pássaros
escaparam a um centímetro de mim,
e riram muito da minha inabilidade;
quando sacava a hora certa de me retirar
já havia levado um pé no traseiro;
quando pensava estar sendo carinhoso sem servilismo,
via que ninguém entendia o que fazia
um gato com um jornal na boca;
quando imaginei que não importunava as visitas,
eu as via irritadas com meus estridentes
e desafinados miados;
quando minha vontade prevalecia
não conseguia festejar em silêncio;
quanto mais orgulhoso me sentia da minha excêntrica
e firme personalidade, mais abanava o rabo por qualquer presentinho
e todos acabavam rindo de mim;
mas o pior de tudo era quando lambia
a mão de alguém que no dia anterior
já me dera uma humilhante vassourada!
Chega! Algo deu errado!
Já que você não sabe fazer tudo certo,
quero voltar a ser cão!
O mago, após ouvi-lo com muita paciência,
disse-lhe cheio de compreensão:
" Você queria ser um gato e eu o transformei num gato.
Sou um mago, mas não sou Deus.
Posso mudar a aparência de coisas e de seres,
mas não posso mudar-lhes a essência.
Eis porque, mesmo parecendo um gato,
você sempre será um cão.
Isso não é possível mudar.
Cada um é apenas o que veio para ser,
de acordo com sua essência
e seu grau espiritual de evolução.
A essência é nossa alma.
Isto dito, o cão voltou a ser cão,
só que desta vez todo confuso e,
na continuação, sempre machucado.
Sua essência não se modificara,
mas sua insatisfação consigo mesmo
e sua frustração por não poder ser o que queria,
fizeram com que ele passasse o resto dos seus dias
machucando-se, mordendo seu próprio rabo.
Enquanto isso, o mago, do outro lado da aldeia,
continuava a ensinar às crianças:
" Não menospreze sua essência, ela é a sua Alma.
Aceite quem você é, aceite o que você é,
caso contrário,
o preço a pagar será muito alto." (S i l v i a S c h m i d t)